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quinta-feira, março 28, 2024

As dificuldades do combate à corrupção no Brasil

Por Dr. Roberto Livianu

São já 5 anos e meio de Lava Jato, 6 da lei da colaboração premiada, 7 do processo criminal do mensalão e lá se vão mais de 31 de Constituição Cidadã. Mesmo assim, 73% dos brasileiros continuam temendo retaliação se denunciarem a corrupção. Este é sinal claro de que há um campo com areia movediça em torno dos números da corrupção no Brasil (que nos impede de quantificá-la com exatidão) em face da óbvia grandeza dos índices de subnotificação (casos não denunciados, a chamada “cifra negra” criminológica).

Para 54% dos brasileiros, a corrupção, de um modo geral, aumentou (em relação a 2018). E para 63% deles, todos ou a maioria dos integrantes do Congresso Nacional estão envolvidos com a corrupção. Para 57% dos ouvidos, a Presidência da República também está envolvida, mesmo tendo sido o Presidente eleito com discurso enfático à luta anticorrupção. Para igualmente 57% dos ouvidos, o Governo Federal não realiza bom trabalho no combate à corrupção.

É chocante este outro número, mas a verdade é que 40% dos ouvidos no Brasil já foram abordados com ofertas para a compra de seus votos. Pior que este percentual na região, somente o México (50%) e a República Dominicana (46%).

Mesmo neste contexto, o Congresso aprovou uma nova lei de partidos políticos que permite que se utilizem recursos do fundo partidário sem limites com despesas de advogados e contadores, mesmo se sabendo que a precificação de serviços de advogados é complexa e que isto institui brecha para o caixa 2 eleitoral, legitimando-se artificialmente gastos indevidos, como a compra de votos. Autorizou ainda a nova lei a compra de helicópteros ou veículos de luxo.

Os números estão dolorosamente apontados no relatório da 10ª edição do Barômetro Global da Corrupção, realizado pela Transparência Internacional, ouvindo 17.000 pessoas em 18 países (1.000 delas no Brasil), divulgado nos últimos dias, ressalvando que a análise observa aspectos relacionados à percepção subjetiva da corrupção e deixa de analisar a quantidade e qualidade da vitalidade no enfrentamento deste fenômeno pelas instituições, vale destacar que se há mais visibilidade em relação à corrupção e em boa parte isto deve ser creditado a seu desmascaramento e corajoso combate.

Por outro lado, a pesquisa aponta que apenas 11% dos brasileiros teriam pago propina. Com números melhores, apenas Barbados (9%) e Costa Rica (7%). Mas a verdade é que nosso problema não é a corrupção miúda do varejo, e sim, a grande fraude, a corrupção eleitoral, a corrupção nos partidos políticos, nas licitações para contratações públicas.

Estes números não consideraram a aprovação da Lei Renan Calheiros de abuso de autoridade, a obstacularização do trabalho do Coaf (hoje UIF) para informar o MP sobre transações financeiras suspeitas e da Receita Federal, pretendendo-se cercear sua autonomia e muito menos a nova lei dos partidos, que, como já se enfatizou, abre brechas para o caixa dois eleitoral e para a lavagem de dinheiro.

Mesmo assim, misteriosamente, para 82% dos brasileiros, o cidadão comum daqui pode fazer a diferença. Nosso otimismo ainda se sobrepõe surpreendentemente às agruras terríveis do sentimento de impunidade da corrupção, que ainda imperam, já que Mensalão e Lava Jato tocaram apenas a ponta do iceberg. E hoje, 90% dos brasileiros percebe a corrupção como um grande problema nacional (acima da média da América Latina – 85%).

Para vencer, não bastam investigações, processos e penas. Falta reforma político-partidária, novas medidas contra a corrupção, fim do foro privilegiado, mais transparência, escolhas conscientes nas eleições e muito mais. Mas, ter consciência sobre a gravidade do problema e estar otimista em relação a seu enfrentamento lastreiam e permitem um primeiro passo. Avancemos!

Roberto Livianu é promotor de Justiça São Paulo, doutor em direito pela USP, presidente do Instituto Não Aceito Corrupção (INAC) e diretor do Ministério Público Democrático (MPD).

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